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Antroposofia

Autora: Dra. Angélica Alves Justo

Antroposofia – Ciência Espiritual, como podemos definir? Este termo foi usado por Rudolf Steiner em 1913, na época da fundação da Sociedade Antroposófica. Porém, o termo Antroposofia foi usado pela primeira vez por Ignaz Paul Vital Troxler (1780-1866), segundo Nicolla Abbagnano (2000, p. 68), para indicar a doutrina natural do ser humano (Naturlehre der menschlichenerkemmtnis) e utilizado por Rudolf Steiner em 1913, com a fundação da Sociedade Antroposófica.

O termo Ciência Espiritual foi utilizado também por Diltey (1833-1911), que viveu em uma época marcada pelo avanço da ciência, e em particular das Ciências Exatas. A Física e o Método Experimental eram a referência para todas as ciências. A filosofia de Dilthey assumiu uma função programática de encontrar um lugar para aquilo que designou por “Ciências do Espírito”, que denominamos hoje Ciências Humanas (Sociologia, Psicologia, História, Antropologia, etc…).antroposofia_texto_Goetheanum

Às Ciências Exatas atribui-se uma vocação “explicativa” dos fenômenos naturais. O seu objetivo é o de estabelecer relações constantes e necessárias entre os fenômenos observados, cujas causas podem ser isoladas e descritas. Explicar é prever aquilo que por natureza é repetível. Às “Ciências do Espírito” atribui-se a missão “compreensiva” dos fenômenos humanos. O seu objetivo é o de procurar elucidar aquilo que é único, isto é, não repetível, onde as causas são múltiplas e dificilmente isoláveis. A principal obra de Diltey é “Einleitung in die Geisteswissenchaften” – Introdução às Ciências do Espírito – 1833.

Rudolf Steiner ( 1861- 1925), filósofo, contribui com todo o seu conhecimento da Filosofia e de vivências espirituais, na fundação da Sociedade Antroposófica em 1913, que deu uma ampliação no saber das ciências atuais, como a Medicina, Psicologia, Pedagogia e as artes.

Estarei fazendo um pequeno resumo do pensamento filosófico, através das épocas culturais até chegarmos à compreensão do ser humano segundo a Antroposofia.

 

Processo do pensamento filosófico através das épocas culturais:
Hindus – Para os hindus existem três divindades espirituais que derivam de Brahman: Brahma, Vishnu e Shiva, e a realidade era Maya (ilusão). Na cultura indiana não há o ideal de pessoa. Temos as castas; a denominação de Filosofia e Religião não existem.
Egípcios – Visão piramidal onde o faraó era o representante da divindade na terra. As entidades espirituais representadas pelo Antropomorfismo eram Aton, Rá, Ámon, Osíris, Ísis e Hórus. O corpo era embalsamado esperando o retorno da Alma.
Persa-Babilônica – Zoroastrismo (Ahura Mazdao, Ohrmazd). Dualidade luz-treva, corpo-alma, bem-mal. Acreditavam na transmigração da Alma e da Metempsicose (crença na transmigração da alma de corpo em corpo. Essa crença é muito antiga e de origem oriental).
Greco-Romana – A psyché seria uma partícula da “Alma do Mundo”, que fica aprisionada no corpo. Segundo Platão, isto é explicitado no pecado de “Hybris” (a Alma individual diz: “Eu quero ser como você” – Alma Mundi). A civilização grega trouxe a Filosofia e foi marcada por Sócrates, Platão e Aristóteles. Para Platão vivemos no mundo das ideias (transcendente) e para Aristóteles, na matéria – espírito (imanente). A cultura ocidental está alicerçada em duas bases: a tradição judaico-cristã com o ideal de pessoa e a tradição helenística com o ideal racional – logos. Na Índia não temos o ideal de pessoa (castas) e nos países islâmicos o Alcorão domina a razão (ideal racional). O uso da reflexão, a Filosofia e o Direito Humano vieram com a civilização greco-romana.
Idade Média – a fé domina a razão (escolástica). Na mística medieval, o místico recebia uma iluminação (lumennaturalis), já no racionalismo temos na nossa razão uma revelação (numinoso).
Modernidade – Marcada pelos iluministas Descartes e Kant.

René Descartes (1596 – 1650)
Cogito ergo sun (Penso logo existo). Autor de “Discurso sobre o Método” (1637) e “Meditações”. A sua concepção de homem era uma dualidade corpo-espírito. O Universo consiste de duas diferentes substâncias: a mente (substância pensante) e a matéria, sendo essa última basicamente quantitativa, teoricamente explicável em leis científicas e fórmulas matemáticas. René Descartes influenciou o século XVI com a visão mecanicista do coração bomba, pulmão fole e o metabolismo como mecanismo de queima de combustível.
A “redução cognitiva” permite isolar e compreender esquematicamente certos fenômenos, mas perde-se a visão do todo.
Desde o século XVI aparecem correntes epistemológicas, que se contrapõem ao pensamento mecanicista – o Cartesiano. Temos ainda a redescoberta da Alquimia no século XVI com Paracelso (1493-1541), a Homeopatia – Hahnemann (1755-1843), o Vitalismo – princípio vital, com Bergson (1859-1941), o Mesmerismo – Franz Anton Mesmer (1734-1815), a Teosofia – Blavatsky (1831-1891) e o Espiritismo com Allan Kardec (1804-1869).

Kant (1724-1804)
“Crítica da Razão Pura e da Razão Estética” – “Não podemos conhecer a coisa em si, mas apenas aquilo que apreendemos, Deus in se, Deus pro me” (Deus em si, Deus para mim). Kant estabeleceu limites para o conhecimento. Fez uma distinção entre aparência (o mundo dos fenômenos) e a realidade (o mundo dos noumenons). Afirmava que os argumentos metafísicos tradicionais sobre a Alma, a Imortalidade, Deus e o Livre-Arbítrio ultrapassavam os limites da Razão. O emprego legítimo da Razão é na esfera prática, conhecendo o mundo.

Filósofos Românticos:
Nos séculos XVIII e XIX houve uma reação à ideia racionalista iluminista (conflito entre a Ciência e a Religião), que surgiu na Europa com os românticos, representados por poetas, escritores, artistas e filósofos como Goethe, Rosseau, Schopenhauer, Fichte, Shelling, Shiller, Hegel, Wagner e Nietzsche.

Goethe (1749-1832)
Quando jovem foi um motor do Romantismo Anárquico do “Sturm und Drang” (Tempestade & Tensão). Em sua viagem na Itália, Goethe recolhe espécimes de plantas, estuda os ossos dos animais, os minerais, contempla a natureza, coleciona, escreve, desenha e pinta. No Jardim Botânico de Palermo Goethe intui a noção de uma “Planta Primordial”, modelo arquetípico do qual derivariam todas as formas vegetais. Ele quer encontrar o vínculo que reúna a diversidade. Ele via, contemplando as plantas, que todas elas seriam apenas variações diferenciadas de um mesmo modelo arquetípico fundamental e que seria uma “ideia-planta”. Mesmo em uma única espécie, cada parte da planta é metamorfose de outras partes, observa Goethe, e com esse insight iniciará sua obra de botânica meramente classificatória que Linneu havia começado a empalidecer, na medida em que valoriza a percepção das partes, das diferenças, buscando o vínculo “por trás”.
Através de observações botânicas, Goethe buscava uma imagem da Natureza diferente da visão mecanicista de Bacon, Newton ou de Linneu: uma Natureza viva, “Mãe”, dotada de uma espécie de inteligência primordial revelada e visível através dos fenômenos sensíveis. Uma natureza vivente, dotada de um Unus Mundus semelhante ao imaginado por Nicolau de Cusa e pelos Alquimistas do século XVI. A Natureza é uma tecelã, cujos fios são a vida e cujos intervalos entre os fios são a morte.
Seu grande poema “Fausto” levou sessenta anos sendo escrito e foi muito além da reação romântica, terminando nas reviravoltas espirituais e materiais da Revolução Industrial. Fausto acaba vendendo a alma ao Diabo não por dinheiro, sexo ou fama, mas sim pelo direito de controlar a Natureza, para transformar o mundo medieval por meio de uma imensa força de trabalho organizada. Fausto torna-se o primeiro developer – o arquétipo do empresário moderno. Em “Fausto”, Goethe escreve:
“Teço para cá e para lá
Nascimento e túmulo,
Um mar eterno
Um tecer alternante
Uma vida alternante
Eis como trabalho no tear sibilante do tempo
E crio as vestes vivas da Divindade”.

Fichte (1762-1814)
O ego – sujeito, era a matéria fundamental de investigação, o mundo era só “ego absoluto”, uma espécie de sujeito gigante. Essa tese foi adotada mais tarde por Hegel e pelos nacionalistas alemães.

Shelling (1775-1854)
Era muito ligado aos românticos alemães e tentou combinar a filosofia crítica de Kant com uma explanação mais ampla da importância da arte.

Shiller (1759-1805)
Shiller desenvolveu Kant e propôs a arte como uma atividade desinteressada. É fundamental tanto para a vida pública quanto para a individual. Suas ideias faziam parte da atitude romântica predominante que considerava a arte indispensável.

Para o Iluminismo o atributo humano que melhor distingue o homem dos animais é a razão. Para o Romantismo a racionalidade é considerada uma ameaça à individualidade e à criatividade humana. O homem em seu estado natural desfrutava de uma perfeita harmonia entre as paixões, os desejos, a felicidade e a paz.
Tal movimento se contrapunha à mentalidade cartesiana e mecanicista hegemônica.

Filósofos do Idealismo Alemão
Hegel (1770-1831)
Foi o maior dos idealistas alemães, certamente o mais difícil de entender e possivelmente o mais escandaloso em suas pretensões de ter entendido toda a história da Filosofia. Hegel fundamentava que tudo estava interligado, enquanto a maioria dos filósofos, a partir de Aristóteles, defendia que a realidade tinha de ser separada em partes distintas, quer como fatos, objetos ou mônadas. Hegel afirmava que nada era desconexo. A realidade última era a ideia absoluta – “a verdade é o todo”.

Shopenhauer (1788 – 1860)
Aparece como a antítese absoluta de todo o Movimento Idealista Alemão. Não gostava dos grandes sistemas e preferia um pensamento único. Rejeitava a Filosofia Acadêmica e combatia os metafísicos hegelianos, sua filosofia da religião e seu nacionalismo germânico. Declarando-se ateu, pensava no Iluminismo, e, sobretudo em Voltaire. Sua obra mais importante foi “O Mundo como Vontade e Representação”. Shopenhauer parte de Kant e diz que “a coisa em si” tem correspondência com a “Vontade”. A ideia da “primazia da Vontade” influenciou filósofos como Nietzsche (1844-1900), Freud (1856-1939) e Bergson (1859-1942).

Rudolf Steiner (1861-1925)
Com este apanhado histórico filosófico, podemos contextualizar Rudolf Steiner (1861-1925) e suas leituras filosóficas, as quais influenciaram sua obra e o termo Antroposofia – Ciência Espiritual.
Rudolf Steiner foi aluno de Franz Brentano (1838-1917), que com a sua Psicologia Descritiva foi considerado o pai da Escola Fenomenológica. Sua Fenomenologia era chamada de “Filosofia Descritiva da Experiência” na qual as visões de mundo inter-relacionadas preocupam-se com a subjetividade e com uma descrição desta subjetividade. Foi Husserl (1859-1938) que estabeleceu o método básico da Fenomenologia em investigações lógicas.
Seguido por Martin Heidegger (1889-1976), pretendia voltar aos fenômenos. Por fenômeno ele entendia tudo o que aparece à consciência,daí Fenomenologia. Depois que o “Dasein” se junta aos fenômenos – que é como o ser encontra o mundo -, tudo dá errado quando o “Outro” entra em cena. Heidegger estava tentando descobrir a verdade sobre o ser, uma “Ciência do Ser” que explicasse a existência. A angústia e a falta de sentido se instalam, e só se conhece o “Dasein” por meio dessa angústia.
A busca da verdade influenciou Jean-Paul Sartre (1905-1980), que desenvolveu as ideias de Husserl e Heidegger, organizando-as num corpo de pensamento coerente, conhecido como Existencialismo. Em seus romances, peças e atividade política, Sartre preocupou-se com uma filosofia da decisão e da liberdade. Ele queria trazer a Filosofia para as ruas, seu pensamento era sobre um estar-no-mundo.

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